O Brasil no 'The Economist'
Esta semana a capa da revista 'The Economist' mostra a estátua do Cristo Redentor com sua base pegando fogo - assim como se fosse um foguete prestes a decolar.
A reportagem sobre o Brasil cobre 14 páginas e é bastante interessante - e verdadeira.
De fato, toda vez que ouço alguem me dizer que o Brasil está indo muito bem e será a nova 'Grande Potência do Futuro...' , não consigo evitar de sentir um calafrio - uma espécie de reação automática que me passa pelo corpo, como que dizendo: Heim? Says who??
É que quando penso em uma 'Potência Mundial' - e talvez minha definição pessoal de 'potência' não tenha nada a ver com a realidade...- imediatamente me vem a mente um país desenvolvido, com a maioria de suas estradas asfaltadas, onde raramente se ouve falar em assaltos dentro ou fora das cidades, oferecendo educação gratuita e TÃO BOA aos seus cidadãos, que raramente alguem ( mesmo alguem extremamente bem de vida !) pensa em mandar seu filho para uma escola particular; um país com um sistema de saúde público excelente , com as ruas de suas cidades limpas e livres de pedintes e crianças abandonadas, onde favelas são coisas que só se vê em 'cartões postais' de OUTROS países; um lugar onde pessoas ricas e importantes TAMBEM vão presas e onde os políticos têm vergonha de roubar, ou pelo menos MEDO de serem pegos!
Então, analisando o calafrio involuntário que costumo sentir em tais ocasiões , sou obrigada a chegar a conclusão de que essa reação física que experimento, nada mais é do que um misto de tédio, incredulidade, ceticismo ... e talvez lá no fundo, uma pontinha de esperança.
Mas logo as imagens de minha última estada ( geralmente de poucas semanas ou meses atrás ...) no Gigante do Sul me vêem a mente como em um flashback desagradável e, assim como um balão de ar picado por uma agulha, estouro, murcho e é como se jamais tivesse existido.
Mas voltando à reportagem que fala sobre o Brasil no 'The Economist' desta semana...
Fazia tempo, muito tempo , que não lia algo tão claro, objetivo e sem falso sentimento de patriotismo , mas ao mesmo tempo com uma mensagem de esperança e otimismo.
Gostei especialmente da parte onde o autor compara os Estados Unidos e o Brasil , no que cada país tem de parecido e diferente. E da parte onde descreve o Gigante do Sul como sendo DOIS países separados: 1) Um lugar onde não há guerras, onde se fala a mesma língua em todo o seu imenso território, onde não há conflitos religiosos, onde 1/3 da população vota ( mas cá entre nós, sabemos que somos OBRIGADOS a fazê-lo, não ? ) e onde o resultado das eleições sai no dia seguinte; um país com um mercado financeiro sofisticado e com uma coleção cada vez mais crescente de companhias nacionais de importância mundial (Embraer, Petrobrás, Vale do Rio Doce, Odebrecht etc...)
2) O outro Brasil é aquele com um número altíssimo de assassinatos ( 45,000 mil por ano) e uma polícia truculenta; um em que muitos ( a maioria?) dos seus políticos não vêem nada de mal em roubar e se recusam a renunciar quando são pegos com a boca na botija. Um lugar onde 17% das casas não têm água corrente e onde milhões de pessoas vivem em barracos no meio de favelas. Um lugar onde muita gente condenada por crimes hediondos ( muitos inclusive réus confessos , como é o caso do Sr. Pimenta Neves...) nunca vai presa e , por fim, um lugar onde ocorre diariamente uma das maiores devastações ambientais .
Last but not least... O artigo do 'The Economist ' dá crédito àquele personagem na história recente do Brasil, VERDADEIRAMENTE responsável por 'todo este atual milagre econômico' - 'milagre' aliás, que só foi possível ocorrer graças à estabilização da economia com a adoção do Plano Real em 1994 ; aquele que , com sua troupe de experts econômicos , conseguiu transformar um país com uma moeda completamente desmoralizada e inexistente no mundo lá fora e uma inflação com média anual de 764% entre 1990 e 1995, no que temos hoje : Um país com uma moeda forte e respeitada mundialmente e com uma inflação anual na faixa dos 6% ( 5,9% em 2008)
Em suma, aquele que deixou esta 'herança bendita' para o atual governo :
Fernando Henrique Cardoso.
( Sim, quem tinha pelo menos 20 anos em 1994, se lembra de um Brasil MUITO diferente deste que temos hoje em dia !!)
Mas pra mim, talvez a frase mais interessante e a que resume melhor tudo o que foi dito ao longo da reportagem da revista sobre o Brasil , seja esta:
"Judged against its own past, Brazil is doing astonishingly well. Judged against its potencial, it still fares poorly.'
( A julgar pelo seu passado , o Brasil está se saindo incrivelmente bem. A julgar pelo seu potencial, ele ainda está indo muito mal...'
Então, PARABÉNS 'The Economist' ! - por um artigo tão bem escrito, informativo e cheio de insight.
No futuro, quando ouvir novamente algum estrangeiro ( os brasileiros que conheço costumam ser mais pessimistas...) me dizer ' Poxa, ao que parece , o Brasil está mesmo indo muito bem e será uma das grandes potências nos próximos anos!' , é possível que ao invés de sentir um calafrio me correndo pela espinha, eu apenas abra os olhos e levante as sobrancelhas numa ligeira expressão de incredulidade misturada à um certo cinismo - mas nem tanto.