Diário de Bordo- Um pedacinho da França no Caribe
Categoria de post: turismo, diário
Nossa próxima parada foi na ilha da Martinica, e esta pra mim foi a mais interessante de todas pelo fato de ali ser uma extensão da França - não apenas uma ex-colônia francesa, mas realmente PARTE da França atual! Eu não sabia disso . Você sabia??
Sim, a população da Martinica tem cidadania francesa, as estradas entre as cidades da ilha são excelentes , assim como na França, e com as mesmas placas de sinalizações. A moeda deles é o Euro. (Nada mal heim ? Mesmo nas atuais circunstâncias…)
Talvez por isso nossa parada na ilha tenha sido de apenas 5 horas ( ao contrário das outras ilhas onde ficamos cerca de 8…). Segundo minha tia ( que estava fazendo o seu cruzeiro de número 33 – lol - ) , as taxas portuárias ( que os navios devem pagar) são altíssimas e dependem do número de horas que ficam nos portos. Isso explicaria o fato de nas outras ilhas terem tantos transatlânticos e na Martinica ( justamente o único lugar onde a moeda é o Euro) o nosso ser o único navio atracado naquele dia! Mas por outro lado, não duvido nada que a grande maioria dos americanos não se interesse em visitar a ilha ( e eles representam 90% dos turistas no Caribe), já que lá , de preferência, é bom se falar francês e os habitantes locais torcem o nariz na hora de receber em dólar .
Anyway, o fato é que como tínhamos tão pouco tempo para descobrir aquele pedacinho da França no Caribe, optamos por NÃO irmos à praia naquele dia e simplesmente visitarmos as cidades de Fort-de France ( a atual capital e onde o nosso navio atracou) e Saint Pierre, aquela que foi a capital da ilha até 1902, quando aconteceu o impensável.
Uma história ao mesmo tempo fascinante e aterrorizante
A ilha da Martinica tem um vulcão ( o Mont Pelée), ainda ativo, e que explodiu pela última vez em 1929. ( Fiquei sabendo disso no Museu de Vulcanologia que visitamos em St. Pierre).
Nossa aventura histórica ( e arqueológica) começou ao desembarcarmos em Fort-de France ( a atual capital), onde pegamos uma van ( usada pelos habitantes locais ) em direção à Saint Pierre, a cerca de 40 minutos de distância.
A estrada, como já disse, era muito boa - mas meio assustadora porque beirava a costa e era cheia de curvas! A paisagem da ilha é exuberante, com os morros ainda inteiramente cobertos de vegetação ( e como no resto do Caribe, sem favelas empoleiradas neles…). O motorista da van corria como um louco e meu estômago a um certo ponto começou a embrulhar, but what the hell... estávamos na Martinica!
Eu e meu marido eramos os únicos turistas a bordo.
Afinal, chegamos em St. Pierre bem cedo ( fomos dos primeiros a desembarcar do Amsterdam, às 7 da manhã!!) e o tempo estava meio nublado, com uma chuvinha fraca e chatinha, que ia e vinha.
Mas estávamos lá , e embora não pudéssemos tomar o trenzinho que faz o tour pela cidade contando toda sua história macabra ( era cedo demais e teríamos de voltar antes da saída do primeiro trem , às 11 horas…), com a ajuda do meu fiel guia Eye-Witness, ficamos sabendo da existência do Musée Vulcanologique , que tambem contava a história da cidade. Foi a nossa salvação, pois a guia alí era muito simpática e nos deu boas dicas de quais ruínas visitar a pé , mesmo sem o tour do trenzinho. Além disso, o museu em si é bastante interessante, com fotos de St. Pierre antes da erupção de 1902 e alguns artefatos aterrorizantes , como um enorme sino de igreja parcialmente derretido pelas chamas do vulcão.
O pequeno vilarejo de St. Pierre fica na costa e sua praia tem a areia escura, típica das ilhas vulcânicas. Não sei dizer se tem praias boas para se nadar, mas suponho que sim, assim como no resto do Caribe. Hoje a cidade tem apenas 5 mil habitantes e vive principalmente de turismo . É uma espécie de “ Pompéia do Caribe”. Contudo, até 1902 era a principal cidade e a capital da ilha . Então houve a terrível erupção do vulcão , matando 30 mil pessoas e destruindo tudo. Só houve um sobrevivente : Louis Cyparis.
Como isto foi possível??
Louis estava na prisão da cidade ( cujas ruínas hoje podemos ver no alto de um morro…) e aparentemente as grossas paredes da masmorra onde se encontrava o salvaram. Ainda assim, sofreu queimaduras de terceiro grau, ficando para sempre com a aparência deformada. Incrível é que tenha sobrevivido - até porque só foi resgatado por soldados franceses três dias após a explosão do Mont Pelée. Depois disso, Louis ainda viveu por mais de vinte anos, se apresentando como ‘atração turística’ em um circo da região. Ao que parece , terminou seus dias na Nicarágua.
Qual teria sido o seu crime para se encontrar na prisão de St. Pierre naquele dia fatídico?
Imagino que, como todo mundo que o conhecia morreu ( inclusive todos os documentos de sua prisão foram certamente destruídos pelo fogo…), ninguem mais podia acusá-lo de nada! Tanto melhor ( ou pior, sei lá...).
Enfim, nada de trenzinho. Mas, seguindo o conselho da guia do museu, caminhamos até as ruínas do que fora o antigo teatro da cidade ( e cuja foto pudemos ver no museu), assim como a prisão ( lá em cima!) onde Louis Cyparis se encontrava na hora da explosão.
Ainda antes de voltarmos para Fort-de –France, no meio das ruínas próximas à praia, encontramos um cachorrinho. O lado bom é que tinha coleira e não estava magricelo ; o ruim é que estava com a pata machucada. Como ali por perto havia uma boulangerie, compramos um croissant e uma baguette ( meu marido nunca resiste às baguettes genuinamente francesas…lol) e lhe demos de comer. ( O bichinho devorou tudo em dois segundos, mas vai ver ( pelo menos espero…) que era porque os pães ainda estavam quentinhos! )
Por fim seguimos ao longo da rua da praia de areia escura até uma praça, onde aparentemente acontece o mercado da cidade, e lá pegamos a van de volta à capital.
Nosso percurso de volta foi bem mais agradável pois o motorista dirigia bem mais calmo e, na radio, tocava uma suave balada caribenha cantada em francês. Então, não resistindo , perguntei ao rapaz ao meu lado que música agradável era aquela, e ele me respondeu que era de um cantor do Haiti…
Fort-de-France
A atual capital da Martinica tem cerca de 150 mil habitantes e é um blend de França com o Caribe. O francês é a língua falada, mas soa ‘caribenho’. As ruas têm nomes franceses , e é claro que tinha que ter uma rua principal chamada “ Victor Hugo” e outra de “ Avenue de la République !! lol . A arquitetura local tem o seu evidente toque europeu. Contudo, a população ( assim como nas outras ilhas do Caribe) é toda negra . Aliás, não vimos nenhum turista francês , europeu e muito menos americano por lá – nem em St. Pierre , nem em Fort-de-France. Mas talvez eles ainda estivessem dormindo quando chegamos à ilha e apenas acordando quando tivemos de partir ao meio-dia!! Afinal eu simplesmente não posso acreditar que os franceses não viagem à Martinica... Seria como se os americanos não se interessassem em conhecer o estado do Havai. Impensável.
Ainda em Fort-de-France passeamos ao longo do cais e vimos o Forte Saint Louis ( de 1638) de longe - que aparentemente ainda é usado pelos militares franceses, por isso não está aberto a visitação pública. No centro da cidade também visitamos a famosa Biblioteca Schoelcher em homenagem ao escritor e abolicionista Victor Schoelcher . ( O prédio foi construído no final do Século 19 para a Exposição Universal em Paris e depois desmontado e levado para a Martinica).
Finalmente, de volta ao Amsterdam e do deque de cima, pude tirar esta foto da baía e mais esta das construções nos morros ( NADA de favelas, como podem ver...), deste pedacinho de uma França exótica e colorida, tão pertinho da América.
Magnifique , não acham?