A antropóloga e o filósofo
Hoje finalmente venho aqui para completar o portrait dos meus professores no Community College neste segundo semestre e, após devidamente fazer a caveira ( merecida!) de Mrs. Pain, vamos aos outros dois: Mrs. C , de Antropologia Física/biológica e Mr. B , de Filosofia.
Antes de tudo, devo dizer que nosso curso de Anthropologia sofreu um temendo baque logo no começo do programa.
O professor , que era um senhor já de idade e que chegou a nos dar as duas primeiras aulas, estava muito doente ( com uma espécie de infecção intestinal) e , para completar a desgraça foi atropelado por um ônibus e acabou sendo internado! ( Imagino que ele deveria estar muito mal mesmo e DISTRAÍDO quando o acidente aconteceu pois , cá entre nós, não é muito comum alguem ser atropelado aqui nos E.U. - muito menos em Austin e ainda por cima por um ônibus!!)
Bom, pelo menos a última notícia que tivemos dele foi de que já tinha deixado o hospital...
Anyway, com isso fomos obrigados a receber uma 'substituta' - o que foi uma pena pois o 'velhinho' , apesar de sua aparência debilitada, parecia um personagem muito agradável e interessante - inclusive com uma riquíssima esperiência 'antropológica' de vida em Antígua, no Caribe. ( o que certamente teria nos enriquecido muito as aulas...)
Parte A - A antropóloga:
Mrs. C é uma senhora simpática e bonachona, nos seus cinquenta e poucos e apesar de possuir um PhD ,( não sem bem se em Biologia ou Antropologia...), está LONGE de ser uma professora brilhante ( ou mesmo interessante). De fato, suas aulas são de uma mediocridade atroz e sempre iguais, já que tudo o que ela faz em classe é LER os slides de Power Points que prepara baseados na informação que temos no livro. Humph. ( Aliás, a 'salvação' neste caso é precisamente o nosso livro ' Physical Anthropology' de R. Jurmain e co ..., pois este sim, pelo menos é bem escrito, belamente ilustrado e interessante!)
No final das contas , a conclusão que se chega nestes tempos modernos é a seguinte: foram-se os livros, foi-se o talento para ensinar e a tecnologia ao invés de ser usada apenas como um complemento esporádico para enriquecer ou variar a aula, se apossou completamente do ambiente na sala de aula. Pior: o Power Point é que virou o centro de todas as atenções enquanto que o mestre foi rebaixado a mera categoria de coadjuvante!
Mas nem tudo é decepção – ou como dizem os americanos, ‘doom &gloom’. Olhando pelo lado positivo, Mrs. C , ao contrário de Mrs. Pain , pelo menos é boa-praça, não tem qualquer tendência ditatorial ( afinal é uma antropóloga! lol) e nas provas, é bastante justa em sua pontuação.
Já quanto à sua 'aula' ...I’m sorry to say it, a melhor parte dela é precisamente a que deixamos em casa: o Livro de Jurmain!
Parte B
Já no plano da Filosofia, a situação é a seguinte:
Mr. B é, antes de tudo, um excelente professor. Basta dizer que , ao contrário de Mrs. C, até o dia de hoje nunca usou um único Power Point em suas aulas . A razão? Ele REALMENTE sabe a matéria , de cor e salteado, de frente, de lado e de trás! Ou seja: não precisa usar de ‘ recursos tecnológicos’ para disfarçar suas próprias limitações ou encobrir a mediocridade de suas aulas.
No primeiro dia de aula Mr. B foi logo nos avisando :
“Olha pessoal, esse programa é MUITO difícil e eu sou MUITO exigente. Por isso 60 % dos meus alunos costumam desistir logo nas primeiras semanas. A boa notícia é que os que ficam , costumam se sair bem no final do curso…"
Ele não mentiu, já que pelo menos a metade da turma que inicialmente se inscreveu no programa de ‘Introduction to Philosophy’ já picou a mula! Quanto aos que ficaram , se vão realmente ‘se sair bem’, eis uma boa questão que só o tempo vai responder.
De minha parte, só eu sei o quanto tenho me esforçado em suas aulas - lendo TUDO o que é preciso, fazendo TODOS os deveres, não tendo faltado à aula um ÚNICO dia , mal piscando o olho durante suas lectures e anotando tudo como uma maníaca! E tudo isso pra poder , quem sabe, no final do curso me sair com um ‘ Bezinho’.
O filósofo boa pinta:
Não sei por que mas sempre que penso em um ‘filósofo’, imagino um cara pálido e magricelo, com má postura, usando umas roupinhas xinfrim do tipo ‘intelectual pobre’ e sempre equipado de um inevitável par de óculos finos e redondos , no estilo John Lennon…
Mr. B, contudo, não se parece nada com isso e, apesar de não ser mais nenhum ‘garotão’ , sua aparência está mais para a de um ‘-carioca-cinquentão-hedonista-Zona Sul’…lol , do que a de um ‘típico filósofo’.
Sem barriga, de braços fortes e bronzeado… Algo me diz que quando não está em casa analisando os escritos de Hume e Nietzsche, Mr. B deve frequentar uma academia ou ao menos praticar o windsurf no Lago Travis nos fins-de-semana!
Seu rosto tem traços regulares e seus olhos (ele não usa óculos) , de um azul acinzentado, têm uma expressão de ‘ inteligência discreta’.
Apesar de morar no Texas há vários anos, seu sotaque é bem típico yankee – ou seja, do nordeste dos E.U. , já que ele é originalmente do estado de N.Y. e se formou na Universidade da Pennsylvania.
Mas o aspecto mais interessante de sua aparência ( ao meu ver) , são os seus cabelos - e sobretudo o corte , que me chamou a atenção desde o primeiro dia de aula. Trata-se de uma bela e farta cabeleira, suavemente cacheada e já completamente grisalha – o que lhe dá um aspecto de ‘filósofo da antiguidade clássica’. Sim, Mr. B definitivamente me lembra aquelas estátuas dos gregos da época de Péricles. . Ou, quem sabe, o David de Michelangelo - só que trinta anos mais velho e VESTIDO ! lol
Quanto à suas roupas...Eu diria que ele faz o gênero 'yuppie despojado', com seus jeans de corte transado - assim como seu cabelo...lol - suas camisas pólo e sandálias no estilo Mr. Cat.
Resumo da Ópera:
Como vêem, Mr. B é certamente um personagem intrigante , mas para quem está imaginando que ele parece ‘interessante demais para ser hetero…’ , FYI: Ele é casado ( com uma filósofa e professora como ele! lol ) e tem dois filhos já adolescentes.
Já quanto à sua aula...Pra mim só tem um defeito: o PROGRAMA - que é excessivamente voltado para os ingleses ( Locke, Hume, Berkeley…) , além do ultra rígido e chatérrimo ( os filósofos que me perdoem) Kant. Realmente, uma pena que não tenha escolhido para nós algo mais voltado para 'a Grécia antiga' -assim como o corte de seu cabelo! - pois se já é bastante interessante ouvi-lo falar sobre Berkeley e Locke... , imagine como seria com Aristóteles e co!! lol
Ainda assim, digo e repito: de todos os três professores que tive neste semestre, Mr. B é o melhor disparado.
Mesmo que no final do ano eu não consiga me sair tão bem quanto ele previu para ‘ aqueles alunos corajosos e persistentes’ que não desistiram logo nas primeiras semanas…